É PROIBIDA A ACUMULAÇÃO DO CARGO DE VEREADOR COM O DE SECRETÁRIO AINDA QUE EM MUNICÍPIOS DISTINTOS E COM COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS

TCE/ES

PARECER/CONSULTA TC-007/2011

 

 

PROCESSO      – TC-6400/2010

INTERESSADO – PREFEITURA MUNICIPAL DE IBATIBA

ASSUNTO         – CONSULTA

 

 

EXERCÍCIO SIMULTÂNEO DE CARGO DE SECRETÁRIO MUNICIPAL COM VEREADOR – IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAR CARGOS AINDA QUE EM MUNICÍPIOS DIFERENTES.

 

 

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Processo TC-6400/2010, em que o Prefeito Municipal de Ibatiba, Sr. Lindon Jonhson Arruda Pereira, formula consulta a este Tribunal, nos seguintes termos:

 

1. Em tese, pode um vereador de um município, onde a Câmara Municipal de reúna uma vez por semana, após expediente diurno de trabalho, exercer simultaneamente cargo comissionado de secretário municipal em outro município, acumulando as remunerações? Não se aplicam as limitações do art. 31, XVI, e art. 38 e incisos da Constituição Federal, por serem os municípios distintos? Aplica-se na hipótese o permissivo de compatibilidade de horários?

 

 

Considerando que é da competência deste Tribunal decidir sobre consulta que lhe seja formulada na forma estabelecida pelo Regimento Interno, conforme artigo 1º, inciso XVII, da Lei Complementar nº 32/93.

 

RESOLVEM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão realizada no dia nove de agosto de dois mil e onze, à unanimidade, acolhendo o voto do Relator, Conselheiro Marcos Miranda Madureira, preliminarmente, conhecer da consulta, para, no mérito, respondê-la nos termos da Orientação Técnica de Consulta nº 04/2011 da 8ª Controladoria Técnica, firmada pelo Controlador de Recursos Públicos, Sr. Lyncoln de Oliveira Reis, abaixo transcrita:

 

Orientação Técnica de Consulta nº 04/2011: 

 

I RELATÓRIO – Tratam os presentes autos de consulta formulada pelo Sr. Lindon Jonhson Arruda Pereira, Prefeito do Município de Ibatiba, no sentido de ser respondida a seguinte indagação: Em tese, pode um vereador de um município, onde a Câmara Municipal se reúna uma vez por semana, após expediente diurno de trabalho, exercer simultaneamente cargo comissionado de secretário municipal em outro município, acumulando as remunerações? Não se aplicam as limitações do art. 37, XVI, e art. 38 e incisos da Constituição Federal, por serem os municípios distintos? Aplica-se na hipótese o permissivo da compatibilidade de horários? É o relatório. II REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE – Antes de adentrar ao mérito da questão, é mister apreciar se estão presentes os requisitos de admissibilidade. Com efeito, encontra-se o seguinte no art. 96 da Resolução TC nº 182/2002 (Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo – RITCEES): Art. 96. A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades: I – ser subscrita por autoridade competente; II – referir-se a matéria de competência do Tribunal; III – conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada; IV – ser formulada em tese;V – conter o nome legível, a assinatura e a qualificação do consulente. No tocante ao requisito constante no inc. I, verificamos que a definição de autoridade competente encontra suas balizas no art. 95, II, do referido diploma normativo: Art. 95. O Plenário decidirá sobre consultas quanto a dúvidas suscitadas na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência, formuladas: II – no âmbito municipal, pelos prefeitos, presidentes de Câmaras, presidentes de Comissões Parlamentares da Câmara Municipal, dirigentes de autarquias, das sociedades de econoia mista, das empresas públicas e das fundações instituídas e mantidas pelo Município. [grifo nosso] De fato, sendo o consulente Chefe do Poder Executivo Municipal, entendemos que se encontra atendido o primeiro requisito. Verificamos também que o referido dirigente está devidamente qualificado nos autos, donde consta seu nome legível e assinatura (inc. V). Ademais, a questão trata de matéria de competência desta Corte, pois se refere à possibilidade de acumulação de mandato eletivo de vereador com secretário de outro município, onde há compatibilidade de horário, matéria que interessa diretamente ao controle externo. Constata-se, outrossim, que há indicação precisa da dúvida e que tal foi formulada em tese (art. 96, IV, RITCEES), conforme se depreende da leitura do Relatório. Por derradeiro, entende-se que resta atendida também a exigência do art. 95, caput, do diploma normativo em questão, que prevê a indicação de dispositivo legal ou regulamentar sobre o qual paire dúvidas, a saber, os artigos 37, XVI e 38, ambos da Constituição Federal. Isto posto, reconhecendo que estão presentes os requisitos de admissibilidade da consulta, sugere-se o seu conhecimento. III MÉRITO – O deslinde da questão passa pela análise do art. 29, IX, da CF, que assim estabelece: Art. 29 O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:[…] IX- Proibições e incompatibilidades, no exercício da vereança, similares, no que couber, ao disposto nesta Constituição para os membros do Congresso Nacional e, na Constituição do respectivo Estado, para os membros da Assembléia Legislativa; [grifo nosso] José Afonso da Silva ensina que incompatibilidades são regras que impedem o parlamentar de exercer certas ocupações ou praticar certos atos cumulativamente com o seu mandato. Segundo ele, são impedimentos referentes ao exercício do mandato[1].No âmbito federal, tais incompatibilidades estão presentes no art. 54, da Constituição Federal (CF), dentre as quais destacam-se: Art. 54   Os Deputados e Senadores não poderão: I – desde a expedição do diploma: a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; b) aceitar  ou  exercer  cargo,  função  ou  emprego  remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades constantes da alínea anterior; […] Tal previsão decorre do Princípio da Separação de Poderes (art. 2º), que impede a investidura simultânea em funções de Poderes distintos, salvo

 

nas hipóteses em que a própria CF autorizar. E, de fato, ela o fez no art. 56, nos seguintes termos: Art. 56 Não perderá o mandato o Deputado ou Senador: I – investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplomática temporária; […] José Afonso da Silva destaca que o cargo de Ministro de Estado, e os correlatos a ele, por conseguinte, são considerados demissíveis ad nutum e, portanto, teriam a investidura proibida, caso não houvesse a ressalva em questão[2]. Assim, em princípio, é possível que a Lei Orgânica de um Município, reproduzindo o dispositivo em questão, admita que o Vereador possa exercer o cargo de Secretário do Município. Não obstante, será necessário o seu afastamento do mandato, resultando, inclusive, na convocação do suplente (art. 56, § 1º, da CF[3]). Isso porque, embora tal cargo não se enquadre exatamente no conceito de cargo comissionado, mas sim no de agente político, sua natureza é muito próxima daquele, exigindo-se, portanto, dedicação integral ao serviço. O vínculo, aliás, é precário, dependendo da confiança da autoridade que o nomeou (Prefeito, no caso). Nesse sentido, entende-se que o exercício do cargo de Secretário Municipal por Vereador só é possível na hipótese de afastamento deste, nos termos do art. 56, I, da CF, não em regime de acumulação. Isso se deve ao fato de que o art. 38, III, da CF, não traz expressamente essa alternativa e, como o referido dispositivo é um caso excepcional, não deve ser interpretado extensivamente. Vale destacar que o Tribunal de Justiça do Paraná, em situação análoga envolvendo cargo comissionado, assim se posicionou: RESTITUIÇÃO. VENCIMENTOS DE CARGO EM COMISSÃO. CUMULAÇÃO COM SUBSÍDIOS DE VEREADOR. VEDAÇÃO. ARTIGOS 38, I E III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E 28 E 58, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, COMBINADOS COM OS ARIGOS 14, III e 37, I, letra B, DA LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE SABÁUDIA. SENTENÇA REFORMADA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO.- Vedado ao vereador no desempenho do mandato exercer emprego ou função remunerada de que seja demissível ad nutum, se exerceu cargo em comissão recebendo vencimentos, está obrigado a restituir o que no exercício do cargo comissionado recebeu [grifo nosso]. (REEX 1089105 PR, Rel. Des. Jesus Sarrão, 3ª Câmara Cível, 11/12/2001) De forma mais clara, identifica-se julgado do STF tratando exatamente da questão: EMENTA: RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. VEREADOR. SECRETÁRIO MUNICIPAL. ACUMULAÇÃO DE CARGOS E VENCIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DOS RECURSOS. I – Em virtude do disposto no art. 29, IX, da Constituição, a lei orgânica municipal deve guardar, no que couber, correspondência com o modelo federal acerca das proibições e incompatibilidades dos vereadores. II – Impossibilidade de acumulação dos cargos e da remuneração de vereador e de secretário municipal. III – Interpretação sistemática dos arts. 36, 54 e 56 da Constituição Federal. IV – Aplicação, ademais, do princípio da separação dos poderes. V – Recursos extraordinários conhecidos e providos [grifo nosso]. (RE 497554/PR, Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI, 27/04/2010, Primeira Turma). Isto posto, conclui-se que não é possível a cumulação de mandato de Vereador e de Secretário Municipal, seja no mesmo Município ou em diverso, havendo compatibilidade de horários ou não, por força de interpretação sistemática do art. 29, IX, art. 38, III, art. 54, I, b, e art. 56, I, todos da CF. IV CONCLUSÃO – Por todo o exposto, opina-se no sentido de que a presente consulta deve ser respondida no sentido de ser proibida a cumulação de mandato de Vereador e de Secretário Municipal, seja no mesmo Município ou em diverso, havendo compatibilidade de horários ou não, por força de interpretação sistemática do art. 29, IX, art. 38, III, art. 54, I, b, e art. 56, I, todos da CF.

 

 

Presentes à sessão plenária da apreciação os Srs. Conselheiros Sérgio Aboudib Ferreira Pinto, Presidente, Marcos Miranda Madureira, Relator, Elcy de Souza, Sebastião Carlos Ranna de Macedo, José Antônio Almeida Pimentel e os Conselheiros em substituição Marco Antonio da Silva e Márcia Jaccoud Freitas. Presente, ainda, o Dr. Domingos Augusto Taufner, Procurador-Geral do Ministério Público Especial de Contas.

 

Sala das Sessões, 09 de agosto de 2011.

 

 

CONSELHEIRO  SÉRGIO ABOUDIB FERREIRA PINTO

Presidente

 

 CONSELHEIRO  MARCOS MIRANDA MADUREIRA

Relator

CONSELHEIRO  ELCY DE SOUZA

 CONSELHEIRO SEBASTIÃO CARLOS RANNA DE MACEDO

 CONSELHEIRO JOSÉ ANTÔNIO ALMEIDA PIMENTEL

 CONSELHEIRO MARCO ANTONIO DA SILVA

Em substituição

 CONSELHEIRA  MÁRCIA JACCOUD FREITAS

Em substituição

DR. DOMINGOS AUGUSTO TAUFNER

Procurador-Geral

 

Lido na sessão do dia:

ODILSON SOUZA BARBOSA JUNIOR

Secretário Geral das Sessões


[1] SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 422.

[2] SILVA, 2005, p. 425.

[3] Art. 56 […]

§ 1º -  O suplente será convocado nos casos de vaga, de investidura em funções previstas neste artigo ou de licença superior a cento e vinte dias.

3 comentários

  1. mateus

    no topico de numero “1” no lugar de “art. 31” deveria estar escrito “art 37”.

  2. Rômulo Marini

    Gostaria de saber se é possível acumulação dos cargos de vereador e controlador do município?

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